Após seis anos de muita discussão, estudos e análises, as novas regras para rotulagem nutricional começaram a valer desde o último domingo, 9 de outubro, e trazem mudanças profundas quanto à declaração de nutrientes na tabela, uso de alertas frontais e alegações nutricionais. O objetivo do selo é atentar o consumidor sobre excessos de açúcares adicionados, gorduras saturadas e sódio adicionados ao alimento. Logo, os novos selos informativos vão ajudar na escolha de alimentos mais saudáveis e, ao longo prazo, na redução de índices de obesidade, diabetes e colesterol alto, entre outras doenças crônicas associadas a nutrientes.
O novo modelo frontal superior facilita a comparação nutricional dos alimentos, em especial os dados por 100 g (produtos sólidos e semissólidos) ou por 100 ml (produtos líquidos), que apresentará figuras em modelo de lupa para indicar alto teor de açúcares adicionados, gordura saturada e sódio.
Serão elegíveis para a rotulagem nutricional frontal os alimentos sólidos ou semissólidos que apresentarem quantidade maior ou igual a 15g/100g de açúcares adicionados; 6g/100g de gorduras saturadas e 600mg/100g de sódio. Para os alimentos líquidos, esses limites devem ser reduzidos pela metade. Caso esses critérios sejam atingidos, os alimentos deverão trazer na metade superior do seu painel principal, o selo de “alto em” para cada nutriente, ocupando uma área entre 2% a 7% de seu rótulo, dependendo do tamanho do painel principal.
“A legislação vem para apoiar o consumidor a fazer melhores escolhas na hora de comprar um alimento ou bebida para sua família. Com as informações cada vez mais claras, abertas e acessíveis, o mercado e as indústrias serão puxados para uma grande transformação, em especial na formulação de alimentos e bebidas, para que possam se adequar às legislações e manterem seu produtos icônicos no mercado, alertando os consumidores,” afirma Pedro Tatoni, Gerente de Marketing Brasil e Cone Sul da Kerry, que é líder mundial no desenvolvimento de soluções em Taste & Nutrition e principal parceira para as indústrias de alimentos, bebidas e farmacêutica.
Outro ponto que vale a pena ser ressaltado é a nova definição trazida pela RDC nº 429/20 sobre “Açúcares Adicionados”, que corresponde a todos os monossacarídeos e dissacarídeos adicionados durante o processamento do alimento, incluindo as frações de monossacarídeos e dissacarídeos vindos da adição de outras fontes, como dextrose, açúcar invertido, xaropes, maltodextrina e outros carboidratos hidrolisados. Nessa somatória, os açúcares naturalmente presentes em produtos lácteos, vegetais e frutas não devem ser considerados.
Além disso, a tabela de informação nutricional deverá trazer os dados apenas em letras pretas, com fundo branco, para garantir a facilidade na leitura. Também deverá ficar localizada próxima à lista de ingredientes e em superfície contínua, não sendo aceitas quebras. Não poderá ser apresentada em áreas encobertas, locais deformados ou regiões de difícil visualização. A exceção fica para os produtos pequenos, aqueles com área de rotulagem inferior ou igual a 100 cm², em que a tabela poderá ser apresentada em partes encobertas, desde que acessíveis, ou em sua embalagem secundária. Há ainda outra mudança nas tabelas nutricionais: o número de porções por embalagem também deverá ser declarado.
A Anvisa também modificou as regras relativas às declarações das alegações nutricionais, com o objetivo de evitar contradições com a rotulagem nutricional frontal. Por exemplo: um alimento com redução de gorduras totais não poderá indicar este atributo em sua rotulagem se apresentar a quantidade de gordura saturada igual ou superior ao limite definido nas regras de rotulagem nutricional frontal.
Novas necessidades, produtos e soluções
Para o público, as informações destacadas nas figuras das lupas na rotulagem frontal serão fatores determinantes em sua decisão de compra. Esta é uma das razões pelas quais a indústria alimentícia precisa se preparar para cumprir a nova regulamentação e enfrentar diversos desafios, pois reformular um produto cárneo, diminuindo a quantidade de açúcares adicionados, gordura saturada ou principalmente o sódio, não é uma tarefa fácil de ser realizada.
Um exemplo disso são as tecnologias da Kerry para preservação de alimentos, que permitem reduzir não apenas o sal, mas também outros ingredientes que contribuem com altos níveis de sódio principalmente em cárneos processados. “Nós partimos de processos de preservação milenares, como por exemplo a defumação, a fermentação, e as conservas em vinagre, e através da ciência criamos ingredientes sustentáveis para atender às demandas da indústria,” declara Alejandra Rullan, Head Latam de Sustentabilidade e Nutrição da Kerry.
Analisando um produto cárneo de forma simplificada, como uma peça de presunto cozido, sua estrutura é composta de várias partes igualmente importantes, como a proteína e a gordura que vêm da carne, o sal e a água, que dá suculência e tem importante papel na dispersão de sabor dos demais ingredientes, especiarias e condimentos utilizados para agregar sabor. De acordo com estudos científicos e com o livro “Meat Products Handbook”, de Gerhard Feiner, o sal não apenas age como intensificador de sabor ou na conservação do produto. Ele tem o papel essencial de proporcionar as condições para a extração das proteínas e, com isso, além de permitir a ligação delas com a água, mantendo o produto suculento, também permite a ligação destas proteínas entre si, proporcionando estrutura e firmeza para o produto. Agora ficou mais fácil de entender por que não é tão simples retirar o sal de um produto cárneo, certo? Além do sabor, a própria estrutura do produto fica comprometida. Mas não podemos esquecer que a redução de açúcares e sódio nos alimentos se trata de uma questão de saúde pública no Brasil e no mundo.
Há mecanismos disponíveis no mercado que permitem o desenvolvimento de alimentos com menos sódio e açúcar em sua composição, mas que continuam entregando um excelente perfil de sabor. São aromas naturais, chamados de moduladores, que interagem com os receptores gustativos da boca, modificando a percepção geral do paladar e aumentando a percepção do sabor salgado, por exemplo, sem deixar sabor residual e mantendo a estrutura do produto cárneo.
“A retirada total do sal do açúcar e da gordura de algumas formulações muitas vezes não impacta somente em sabor, mas também na funcionalidade. Por exemplo, o sal tem um efeito conservante, enquanto a gordura e o açúcar têm um efeito de funcionalidade. Por isso é um grande desafio formular produtos com estas reduções. É neste momento que empresas como a Kerry, através de um amplo portfólio de ingredientes de alta tecnologia agregada, ajudam a indústria de alimentos e bebidas a criar produtos que atendam estas demandas e que continuem com um excelente sabor, “afirma Rullan.
Outra categoria de produtos cárneos que será impactada diretamente pelas novas regras de rotulagem são as soluções congeladas empanadas. As principais características são a crocância, o sabor da carne com a cobertura selecionada para o empanamento, os temperos e o método escolhido para a finalização combinados em um só produto. Em sua maioria, a finalização inclui uma pré-fritura por imersão em gordura vegetal, o que traz um ponto de atenção sobre a presença de gordura saturada ou de gorduras trans – algo também possível de ser reestruturado em produtos no mercado, pois já existem tecnologias que acompanham as tendências de cocção e novas necessidades de consumo. O novo consumidor, hoje, tem mais consciência das desvantagens da fritura, que, mesmo fornecendo sabor e textura, se consumida em excesso, aumenta a possibilidade de obesidade, diabetes e outras doenças.
É importante que os processadores busquem parceiros com expertise e amplos portfólios para que possam ajudá-los a redesenharem e reequilibrarem nutricionalmente os seus produtos. Esse processo exigirá um apoio de ponta a ponta, desde a coleta de informações essenciais, com suporte regulatório adequado, realizações de testes na fábrica para rodar o produto reformulado, sem esquecer a proposta de experiência final para o consumidor, com análises físico-químicas e sensoriais de um time de especialistas, até chegar na fórmula correta, mantendo sabor e proposta de experiência para seus consumidores. O redesenho e reequilíbrio nutricional de produtos é um processo complexo, mas totalmente realizável e é favorável tanto às exigências regulatórias quanto às necessidades do consumidor moderno.
“A Kerry nasceu de uma cooperativa de lácteos na Irlanda onde produtores de leite começaram a produzir ingredientes para as indústrias de alimentos, e por ter este DNA, temos o propósito inspirar os alimentos e nutrir a vida. Defendemos um mundo de nutrição sustentável onde possamos impactar de maneira positiva consumidores de todo o planeta” declara Tatoni.
Prazos para adequação
Com a entrada em vigor da Resolução RDC º 429/20 e a Instrução Normativa IN nº 75/, diversas legislações serão revogadas, como as Resoluções RDC nº 360/03 (rotulagem nutricional de alimentos embalados), RDC nº 359/03 (porções de alimentos para fins de rotulagem nutricional) e RDC nº 54/12 (informação nutricional complementar).
Os produtos que estiverem no mercado na data de entrada da norma em vigor terão, ainda, o prazo de adequação de doze meses (ou seja, até 9 de outubro de 2023). Já aqueles que forem destinados exclusivamente ao processamento industrial ou aos serviços de alimentação, deverão estar adequados já na data de entrada do regulamento em vigor (9 de outubro de 2022), para garantir que os fabricantes de alimentos e bebidas tenham acesso às informações nutricionais das matérias-primas e ingredientes alimentares utilizados em seus produtos. Os alimentos fabricados por empresas de pequeno porte, como agricultores familiares e microempreendedores, terão prazo de adequação maior (24 meses após a entrada em vigor, ou seja, até 9 de outubro de 2024). Os produtos fabricados até o término do prazo de adequação poderão ser comercializados até o fim do prazo de validade.